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Tomei conhecimento há alguns dias de um empresário do setor de logística que, ao estruturar sua holding patrimonial, foi surpreendido com uma autuação milionária de ITBI. A operação? Uma simples integralização de imóveis ao capital social da empresa. O fisco municipal alegou que, por se tratar de uma sociedade com “atividade preponderantemente imobiliária”, a imunidade constitucional não se aplicaria.
Que imposto é esse que desafia a própria Constituição Federal?
Estamos diante de uma das maiores inseguranças jurídicas do sistema tributário brasileiro: a cobrança indevida de ITBI em operações protegidas por imunidade constitucional. O Supremo Tribunal Federal, através do Tema 1.348, precisará responder uma pergunta que afeta milhares de empresários, holdings familiares e planejamentos sucessórios : pode uma norma infraconstitucional limitar o que a Constituição expressamente garante?
O Problema Invisível que Assombra as Holdings Patrimoniais
Empresários que buscam proteger legitimamente seu patrimônio através de holdings se deparam com uma armadilha fiscal silenciosa. A Constituição Federal, em seu artigo 156, §2º, inciso I, é cristalina ao estabelecer que não incide ITBI sobre a transmissão de bens incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital.
Portanto, a imunidade existe, está na Constituição. Mas aqui está o problema: municípios de todo o país, amparados por interpretações tortuosas do artigo 37 do Código Tributário Nacional, vêm afastando essa proteção constitucional sempre que a empresa possui “atividade preponderante” relacionada a imóveis.
Um empresário de Minas Gerais me relatou recentemente que, após constituir uma holding para gestão do patrimônio familiar acumulado em três gerações, recebeu auto de infração exigindo ITBI sobre todos os imóveis integralizados. O argumento da Prefeitura? Como a holding administrava imóveis (sua própria função!), não teria direito à imunidade.
Fique de olho: essa interpretação transforma exceção em regra, subverte a lógica constitucional e cria um ambiente de profunda insegurança jurídica.
A Constituição Não Pede Licença para Valer
Como tenho dito em palestras pelo Brasil, a imunidade tributária não é uma gentileza do legislador – é uma limitação constitucional ao poder de tributar. A diferença é crucial.
Enquanto a isenção pode ser concedida e revogada por lei ordinária, a imunidade está protegida pela própria Constituição. Nenhum município, nenhuma lei infraconstitucional, nenhuma interpretação criativa pode restringi-la. Aristóteles já alertava que “a lei é a razão livre de paixão” – e nossa Constituição estabeleceu com razão que a formação de capital empresarial não pode ser entravada pela tributação.
A função econômica dessa imunidade é evidente: permitir que empresários capitalizem suas sociedades, facilitar planejamentos sucessórios, estimular a formalização de estruturas patrimoniais e remover obstáculos fiscais à livre iniciativa. Ao integralizar um imóvel no capital social, o empresário não está “vendendo” o bem – está reorganizando seu patrimônio dentro de uma estrutura empresarial legítima.
Além disso, essa proteção constitucional se justifica pela supremacia do interesse público na livre organização econômica. Como defensor do contribuinte há mais de 40 anos, observo que a voracidade fiscal não pode se sobrepor aos direitos constitucionalmente assegurados.
O Conflito Entre Constituição e CTN: Que Tributo é Esse?
O artigo 37 do CTN estabelece que a imunidade não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tem como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária. Ocorre que esse dispositivo, criado em 1966, foi recepcionado pela Constituição de 1988 com severas limitações.
Quer saber o melhor? A própria Constituição delimita expressamente quando a exceção da atividade preponderante se aplica: apenas nas hipóteses de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. A integralização de capital não está nessa lista.
Mas aqui vem a distorção: parte da jurisprudência, incluindo decisões do Superior Tribunal de Justiça, passou a aplicar o artigo 37 do CTN também para integralizações de capital, criando uma restrição que a Constituição não prevê. É como se uma lei estadual pudesse limitar um direito fundamental – simplesmente não pode.
Em mais de quatro décadas atuando no contencioso tributário, presenciei inúmeras tentativas do fisco de sobrepor normas infraconstitucionais à Constituição. Como recordista brasileiro em ações tributárias ajuizadas, posso afirmar: essa é uma das mais flagrantes violações à hierarquia normativa.
O Judiciário Pró-Fisco e a Insegurança Jurídica Institucionalizada
Ponto cego: o sistema judiciário brasileiro, em matéria tributária, revela uma tendência preocupante de privilegiar interpretações favoráveis ao fisco, mesmo quando contrariam a literalidade constitucional. O Tema 1.348 expõe essa realidade de forma cristalina.
Tribunais de Justiça pelo país vêm afastando a imunidade do ITBI sob argumentos teleológicos – ou seja, buscando a “finalidade da norma” em vez de sua literalidade. Alegam que permitir a imunidade para holdings imobiliárias abriria espaço para “elisão fiscal” e “planejamentos abusivos”.
Mas reflita comigo: desde quando organizar legitimamente o patrimônio familiar através de uma holding constitui abuso? Desde quando seguir exatamente o que a Constituição determina se tornou “planejamento agressivo”?
Como ex-deputado federal, posso testemunhar que a elaboração legislativa brasileira é frequentemente falha, gerando normas contraditórias e lacunosas. Entretanto, quando a Constituição é clara – e ela é no caso do ITBI –, não cabe ao Judiciário “corrigir” o texto constitucional sob pretexto de proteger a arrecadação municipal.
Holdings Patrimoniais Reféns da Interpretação Judicial
A insegurança jurídica criada por essa divergência tem efeitos devastadores na prática. Empresários que constituem holdings para planejamento sucessório – ferramenta legítima e amplamente recomendada – ficam reféns da interpretação que cada município ou juiz adotará.
Um dado alarmante: estima-se que milhares de autos de infração de ITBI estejam represados aguardando a decisão do STF. Cada um desses processos representa um empresário que agiu em conformidade com a Constituição e, ainda assim, está sendo penalizado. A defesa eficaz contra essas autuações abusivas exige conhecimento técnico especializado e estratégia jurídica robusta.
Tomás de Aquino ensinou que “a lei injusta não é lei”. Que tipo de segurança jurídica temos quando a observância da Constituição não garante proteção contra autuações arbitrárias?
O Que Está em Jogo no Tema 1.348
O reconhecimento da repercussão geral pelo STF no Recurso Extraordinário 1.495.108 representa mais do que a solução de um litígio individual. Trata-se de definir se a Constituição Federal efetivamente prevalece ou se pode ser limitada por normas infraconstitucionais interpretadas de forma expansiva pelo fisco.
Se o STF reconhecer a imunidade ampla – como manda a literalidade constitucional –, haverá um reforço à segurança jurídica e à supremacia da Constituição. Holdings patrimoniais, planejamentos sucessórios e reorganizações societárias poderão ser realizados sem o temor de autuações arbitrárias.
Por outro lado, se prevalecer a interpretação restritiva, estaremos diante de um precedente perigoso: a possibilidade de que direitos constitucionais sejam relativizados sempre que o fisco alegar preocupações arrecadatórias. Esse caminho levaria à completa insegurança jurídica e ao esvaziamento da força normativa da Constituição.
Como “O Tributarista da Reforma Tributária”, organizador do Seminário da Reforma Tributária no Brasil, posso afirmar que decisões como essa do Tema 1.348 impactam diretamente o ambiente de negócios. A previsibilidade tributária é essencial para o planejamento empresarial – e essa previsibilidade só existe quando a Constituição é respeitada em sua integralidade. Esse cenário de insegurança se agrava ainda mais com as mudanças trazidas pela Reforma Tributária de 2025, exigindo atenção redobrada dos empresários.
Estratégias Para Proteger Seu Patrimônio Enquanto o STF Não Decide
Enquanto o julgamento não ocorre, empresários que planejam constituir holdings ou realizar integralizações de capital com imóveis precisam adotar medidas protetivas:
Primeira estratégia: Documente extensamente a operação, demonstrando que a integralização atende aos requisitos constitucionais e que não há valor excedente ao capital a ser integralizado (conforme o Tema 796, já decidido pelo STF).
Segunda medida: Considere requerer medida judicial preventiva, especialmente em municípios com histórico de autuações abusivas. A tutela antecipada pode garantir a realização da operação sem a incidência imediata do ITBI.
Terceira ação: Estruture adequadamente o objeto social da holding, evitando redações que possam ser interpretadas como “atividade preponderantemente imobiliária”. Embora essa limitação seja inconstitucional, a cautela reduz riscos enquanto não há definição do STF.
Além disso, mantenha registros claros da destinação dos imóveis integralizados, demonstrando que não se trata de operação de compra e venda disfarçada, mas de genuína capitalização empresarial.
Por Que o Brasil Precisa de Segurança Jurídica Tributária
Como especialista em direito societário e tributário há mais de quatro décadas, tenho defendido incansavelmente que o contribuinte merece respeito e previsibilidade. O Direito não é uma barreira – é um mapa para navegação segura no complexo ambiente empresarial brasileiro.
A decisão do STF no Tema 1.348 será um divisor de águas. Ou reafirmaremos que a Constituição prevalece sobre interpretações fiscais expansivas, ou nos resignaremos a um sistema onde mesmo direitos expressos na Carta Magna podem ser relativizados.
A livre iniciativa, princípio fundamental da ordem econômica brasileira, depende de que empresários possam organizar legitimamente seus negócios sem o temor constante de autuações arbitrárias. Holdings patrimoniais não são instrumentos de fraude – são ferramentas de gestão, proteção lícita do patrimônio e planejamento sucessório.
Portanto, aguardamos que o Supremo Tribunal Federal cumpra seu papel de guardião da Constituição e assegure que a imunidade do ITBI seja respeitada em sua plenitude, independentemente da atividade exercida pela empresa.
Proteja Sua Holding Antes que Seja Tarde
O Tema 1.348 está em julgamento, mas autuações continuam ocorrendo diariamente em todo o Brasil. Empresários que integralizaram imóveis nos últimos anos podem estar na mira do fisco municipal, enquanto aqueles que planejam fazê-lo enfrentam um cenário de total imprevisibilidade.
Se você possui holding patrimonial, está estruturando planejamento sucessório ou pretende integralizar imóveis ao capital social de sua empresa, não espere uma autuação para agir. A defesa preventiva é sempre mais eficaz – e menos custosa – do que o contencioso tributário.
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Perguntas Frequentes sobre ITBI e Integralização de Capital
1. O que é a imunidade do ITBI na integralização de capital?
É uma proteção constitucional que impede a cobrança do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis quando um imóvel é incorporado ao patrimônio de uma empresa como forma de capital social. A Constituição Federal estabelece expressamente essa não incidência no artigo 156, §2º, inciso I.
2. Por que municípios cobram ITBI mesmo com a imunidade constitucional?
Municípios têm usado o artigo 37 do Código Tributário Nacional para afastar a imunidade quando a empresa possui “atividade preponderante” relacionada a imóveis. Essa interpretação, contudo, contraria a literalidade constitucional e está sendo questionada no STF através do Tema 1.348.
3. Minha holding familiar pode perder a imunidade do ITBI?
Se a interpretação restritiva prevalecer no STF, holdings que administram patrimônio imobiliário (mesmo que familiar) poderiam ser consideradas de “atividade preponderante imobiliária” e perder a imunidade. Por isso o Tema 1.348 é tão relevante para planejamentos sucessórios e patrimoniais.
4. Quando o STF vai julgar o Tema 1.348?
O tema teve repercussão geral reconhecida, mas ainda não há data definida para julgamento. Enquanto isso, processos sobre o assunto em todo o Brasil ficam sobrestados aguardando a decisão do STF, que terá efeito vinculante.
5. Devo esperar o julgamento do STF para constituir minha holding?
Não necessariamente. Com planejamento adequado e estratégias jurídicas preventivas, é possível constituir holdings e realizar integralizações de capital minimizando riscos. O importante é estruturar a operação com assessoria jurídica especializada para garantir que todos os requisitos constitucionais sejam observados.
Este conteúdo é informativo e não constitui consultoria jurídica específica. Para análise personalizada de seu caso, consulte advogado especializado em direito tributário e societário.
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